terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Poema em Linha Reta - Fernando Pessoa

O Marcelo, meu amigo e futuro afilhado, deixou um comentário na postagem ai abaixo me perguntando se eu conhecia o Poema em Linha Reta. Confesso que, apesar de gostar muito de Fernando Pessoa - todos eles, eu ainda não conhecia este poema!

Eu gosto muito quando a leitura nos traz sensações, e esta traz aquele amargor na boca. Não é tão fácil quanto parece se reconhecer falho, aceitar o que se é.

De qualquer forma, gostei do poema e ai vai ele para quem, como eu, até então não conhecia!


Poema em Linha Reta

                                                                                          - Fernando Pessoa -
                                                                                           (Álvaro de Campos)


Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.


E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.


Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...


Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,


Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?


Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?


Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.


Para quem quiser ler outros poemos do Fernando Pessoa ou de outros grandes poetas, recomendo o site Releituras. É de lá que retiro as poesias que posto aqui ou apenas leio algumas delas... É só clicar!!! ;o)

Abraços...
Fefa Rodrigues

5 comentários:

Anônimo disse...

Oi Fefa!!
Esse poema conhecia sim. De Pessoa já li muitos... Acho que todos com seus Heterônimos são maravilhosos, um poeta completo.
Mas, destaco um poema que me cala fundo. Sobre ser simples...
Quero ignorado, e calmo
Por ignorado, e próprio
Por calmo, encher meus dias
De não querer mais deles.
Aos que a riqueza toca
O ouro irrita a pele.
Aos que a fama bafeja
Embacia-se a vida.
Aos que a felicidade
É sol, virá a noite.
Mas ao que nada espera
Tudo que vem é grato.
abç
Orquidea

Fernanda Cristina Vinhas Reis disse...

Fernanda Pessoa é mesmo demais. Mesmo não gostando de poesia, não tem como não gostar. Meu preferido é o que começa assim:

O poeta é um fingidor
Finge tão completamente
QUe chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente

É um soneto, mas eu não lembro como continua.

Quando eu fui pra POrtugal, eu visitei o Mosteiro do Jerônimos, onde está o túmulodele, que
é super legal. É na verdade tipo um obelisco, mas baixinh e em cada um dos lados que são visíveis (ele fica contra uma parede, um nicho), está um dos pseudônimos dele. Não consigo ler um poema dele e não lembrar. Também, na frente do café A Brasileira, que era o preferido dele, tem uma estátua dele, sentado numa mesa, e dá pra tirar uma foto como se você estivesse sentada do outro lado. Você que gosta de foto e de coisas assim, ia curtir. É muit legal.

Beijos!

Fefa Rodrigues disse...

Feeeeeeeee

realmente eu iria (ou irei) adorar, afinal, eu gosto de mosterios, cemitérios e escritores (hehehehe)!!!!

Essa estatua que vc comentou eu ja vi na TV... um dia eu me fotografo ao lado dela!!!;o)

Samuel Medina (Nerito Samedi) disse...

Gosto muito do Pessoa. Mais ainda dos poemas que ele mesmo assina. Acho que me identifico com o próprio Fernando Pessoa do que com seus heterônimos...

moretti disse...

mto legal esse poema!

=)